sábado, 8 de dezembro de 2012

Deito no quarto tentando administrar a bad trip. Cabeça cheia, vergonhosamente inundado de sentimentos. Minhocas trepam dentro do meu crânio e um gato arranha o telhado de zinco enquanto é escaldado pelo sol.

Os últimos dias não têm sido fáceis. Na verdade, desde a volta da última viagem que os dias são duros e as noites frias demais. Me sinto ridículo escrevendo esse 'diário'. Com esforço viro pro lado pra fugir do sol que derrete pela janela até que meu pai entra no quarto e liga a velha televisão já sem cores. O quarto não é grande, cabe a cama e o armário, a tv e uma estante cheia de livros. Já vivemos em lugares piores, sem dúvidas. Já moramos em favelas, quartos abandonados de hotéis abandonados. Sem água, comida, dinheiro."Onde vocês estavam nesses dias?" Meu pai é um homem forte, como poucos. Olho pro lado, vejo ele, seu braço engessado e sinto vontade de falar alguma coisa, mas é sempre assim, nunca falo nada.

Ele está velho e cansado. Mais cansado do que velho. Me lança um olhar vazio, e através de um sorriso no canto da boca, traduz: "Eu sei que estou assim." "Sim, sei. Mas eu sou de ferro atômico." Posso até escutar o tom da sua voz falando essas coisas."Ferro atômico..." Queria devolver um pouco de brilho aos seus olhos tão profundos, mas um homem nessas condições não pode ser ajudado.

Sinto a barriga embrulhar e a vista esmorecer, parece que estou sendo atacado por um grupo raivoso de formigas africanas, uma dor da porra me sobe pela coluna e deixa meu corpo dormente. Me dispo na frente do espelho do banheiro e lá estou eu, face a face com a própria morte. Me encaro por cinco minutos, dez minutos. O gato ainda arranha o telhado de zinco porém o sol já vai baixo.

Uma cabeça enorme , acoplada de qualquer jeito em um pescoço fino, plantado em um tronco mais fino ainda. Magro, amarelo, duas bolas penduradas e um pau que sente falta dela constantemente. Me perdi em algum caminho. Me sinto triste, horrível, imprestável, sem amigos. Elas constantemente me deixam ir, eu também as deixo ir e já começo a pensar se a merda do problema está realmente comigo. Eu poderia facilmente me encaixar nisso tudo. Ter uma namorada, arrumar um emprego, me formar. Dizem que sou inteligente e algo grandioso me espera. Tudo merda!

Não tenho grandes pretensões, só não quero ser mais um. Não tenho medo de sair da zona de conforto, e já sou mais um só de usar esse jargão tão depressivo. Mais depressivo que um saxofone gemendo solitário numa noite chuvosa da cidade.

Vejo amigos se tornando universitários, trabalhadores, procurando empregos decentes, carros decentes, bocetas decentes, enquanto fazem compras em mercados de atacado, junto com a morte que tem cara de velhas senhoras sentadas na calçada a falar mal do vizinho maconheiro às 3 da tarde de uma quinta qualquer.

Em algum lugar nos perdemos, e meu pai sabe disso mais que eu - penso, enquanto saio da frente do espelho com os olhos marejados e o nariz entupido.

Sim, ele sabe de alguma coisa.






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